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A Neurologia Da Empatia


Como tantas vezes acontece em neurologia, os relatos de casos peculiares e bizarros estavam entre os primeiros indícios da base cerebral da empatia. Um trabalho de 1957, por exemplo, examinava vários casos em que os pacientes com certas lesões na área direita dos lobos frontais tinham um déficit curioso: não eram capazes de entender a mensagem emocional no tom de voz das pessoas embora fossem perfeitamente capazes de entender as palavras. Os "muito obrigado" sarcásticos, agradecidos ou furiosos tinham todos o mesmo sentido neutro para eles. Em contraste, um trabalho de 1979 falava de pacientes com danos em outras partes do hemisfério direito que tinham uma falha bastante diferente na percepção emocional. Estes eram incapazes de expressar suas emoções pelo tom de voz ou por gestos. Sabiam o que sentiam, mas simplesmente não podiam transmiti-lo. Todas essas regiões corticais do cérebro, observaram os vários autores, tinham fortes ligações com o sistema límbico.

Esses estudos foram examinados como pano de fundo de um trabalho para seminário de Leslie Brothers, psiquiatra do Instituto de Tecnologia da Califórnia, sobre a biologia da empatia.Examinando descobertas neurológicas, Brothers aponta as amígdalas e suas ligações com a área de associação do córtex visual como parte dos circuitos-chave do cérebro que estão por trás da empatia.

Grande parte da pesquisa neurológica importante vem do trabalho com animais, sobretudo primatas não humanos. Que esses animais demonstram empatia ou "comunicação emocional", como prefere chamar 

Brothers está claro não apenas pelas histórias que se contam, mas também por estudos como o seguinte: treinaram-se macacos rhesus primeiro para recear um certo tom, fazendo-se com que o ouvissem enquanto recebiam um choque. Depois, eles aprenderam a evitar o choque empurrando uma alavanca sempre que ouviam o tom. Em seguida, pares desses macacos foram postos em jaulas separadas, tendo como única comunicação entre si um circuito fechado de TV, que lhes permitia ver imagens das caras um do outro. O primeiro macaco, mas não o segundo, ouvia então o som temido, que trazia uma expressão de pânico à sua cara. Nesse momento, o segundo macaco, vendo o medo na cara do primeiro, empurrava a alavanca que impedia o choque - um ato de empatia, senão de altruísmo.

Havendo estabelecido que os primatas não humanos de fato interpretam emoções na cara de seus iguais, os pesquisadores inseriram delicadamente longos eletrodos pontiagudos no cérebro dos macacos. Esses eletrodos permitiam a gravação da atividade num único neurônio. Os eletrodos que canalizavam neurônios no córtex visual e nas amígdalas mostraram que quando um macaco via a cara do outro, essa informação levava ao disparo de um neurônio primeiro no córtex visual, e depois nas amígdalas. Esse caminho, claro, é uma rota padrão da informação emocionalmente estimulante. Mas o que surpreende nos resultados desses estudos é que também identificaram neurônios no córtex visual que parecem disparar apenas em resposta a expressões faciais ou gestos específicos, como um ameaçador abrir a boca, uma careta terrível ou um dócil agachamento.

Esses neurônios são distintos de outros na mesma região que reconhecem caras familiares. Isso pareceria significar que o cérebro se destina desde o princípio a responder a expressões emocionais específicas - ou seja, que a empatia é um dado da biologia.
outra linha de indícios para o papel-chave do caminho amígdala-cortical na leitura e resposta de emoções, sugere Brothers, é a pesquisa na qual se cortaram as ligações entre amígdalas e córtex de macacos da selva. 

Quando os soltaram de volta a seus bandos, esses macacos podiam enfrentar tarefas comuns como alimentar-se e subir em árvores. Mas os infelizes animais tinham perdido todo senso de como reagir emocionalmente aos outros. Mesmo quando um deles fazia urna abordagem amistosa, os outros fugiam, e eles acabaram vivendo como isolados, evitando contato com seu próprio bando.
Brothers observa que as mesmas regiões do córtex onde se concentram os neurônios específicos da emoção são também as de mais densa ligação com as amígdalas; a interpretação de emoções envolve os circuitos amígdala-corticais, que têm um papel-chave na organização das respostas adequadas.

O valor para a sobrevivência desse sistema é óbvio - observa Brothers.
A percepção da aproximação de outro indivíduo deve originar... e muito rápido... um padrão psicológico [de resposta fisiológica] apropriado à intenção de morder, entrar numa gostosa sessão de cafuné ou copular.

Uma base fisiológica semelhante da empatia em nós humanos é sugerida numa pesquisa de Robert Levenson, psicólogo da Universidade da Califórnia, em Berkeley, que estudou casais casados em que cada um tentava adivinhar o que o cônjuge estava pensando durante uma acalorada discussão. 0 método dele é simples: o casal é filmado em videoteipe e suas respostas fisiológicas medidas quando eles discutem algum problema sério no casamento - como disciplinar as crianças, hábitos de despesa e coisas assim. Cada cônjuge vê a fita e narra o que ele ou ela sentia em cada momento. Depois o cônjuge vê a fita uma segunda vez, agora tentando interpretar os sentimentos do outro.

A mais enfática precisão ocorreu nos maridos e esposas cuja própria fisiologia identificava a do cônjuge que eles estavam vendo. Quer dizer, quando o cônjuge tinha uma reação de aumento de suor, eles também; quando o outro tinha uma queda nos batimentos cardíacos, eles também. Em suma, seus corpos imitavam as sutis reações físicas, a cada momento, do outro cônjuge. Se os padrões fisiológicos do que estava vendo o filme simplesmente repetiam os seus próprios durante a interação original, ele ou ela era muito ruim na suposição do que o cônjuge estava sentindo. Só quando seus corpos estavam em sintonia havia empatia.
Isso sugere que quando o cérebro emocional dirige o corpo com uma forte emoção - o calor da fúria, digamos - há pouca ou nenhuma empatia. Empatia exige bastante calma e receptividade para que os sutis sinais de sentimento da outra pessoa sejam recebidos e imitados por nosso cérebro emocional.


Extraído do livro Inteligência Emocional, de Daniel Goleman

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